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Barbearias são redutos de exaltação da estética afro

Conheça espaços que contam com público cativo em vários bairros da capital baiana

Mãos habilidosas, precisas, e criatividade e foco na valorização do cabelo crespo são elementos identificados em barbeiros considerados referenciais em bairros, principalmente na periferia da capital baiana. O público diverso – nas questões gênero e faixa etária – é atraído pela possibilidade de expressar pela via estética a sua identidade afro.

O aprendizado é orgânico na trajetória da maioria dos nomes que foram transformados em grifes no universo de cortes elaborados que fazem a cabeça da clientela que quer impressionar ao chegar a qualquer ambiente. Até as opções com designs menos elaborados causam impacto a partir da intensificação do contorno com tintas específicas.

Ofício transformador

Barbearias. SCA. Dom Renato. Cajazeira IV. Salvador Bahia. Foto Jefferson Dias.

É assim na barbearia Dom Renato (@renatodombarbearia), em Cajazeira IV. Há 16 anos na profissão, Renato começou na varanda de casa tendo os vizinhos e amigos como primeiros clientes.

“Eu tinha muita destreza com a gilete. Comecei fazendo o pé do cabelo de amigos até que meu pai comprou uma máquina”

A partir daí o espaço ficou pequeno para a demanda. “Quem esperava atendimento se oferecia para ir cortando o cabelo de outros clientes para eu finalizar”. E ele fez escola. Vários ajudantes acabaram adotando a profissão seguindo o mesmo caminho de Dom Renato.

“Muitos meninos negros como eu aprenderam um ofício e construíram seu caminho sem ter que ceder às tentações que poderiam prejudicar a nossa vida e a nossa família”

O império negro de Brotas

Barbearias. SCA. Léo Santos. Brotas. Salvador Bahia. Foto Jefferson Dias.

Já no espaço fundado por Léo Santos (@leo_santos_cabeleireiro), no bairro de Brotas, no tapete vermelho que leva até a área de cortes, estão grafados os termos Reis e Rainhas. É para não deixar dúvida que ali tudo será realizado em prol das ‘coroas’ dos frequentadores. Artistas e intelectuais negros em grafite estão estampados em paredes e portas, como ‘espelho’ para os clientes.

Barbearias. SCA. Léo Santos. Brotas. Salvador Bahia. Foto Jefferson Dias.

São, pelo menos, duas décadas de funcionamento do seu império negro, que, além dos cortes, colorimetria e tratamento sem química de fios crespos e cacheados que deixam pretos e pretas desta cidade sem querer outras mãos e seu ori (cabeça em iorubá), oferece a linha ‘Santos Cachos’, que tem máscara hidratante, de nutrição, leave in, gelatina, ativador, xampu, condicionador.

“Tudo aqui é feito por e para negros. Desde a construção do espaço, passando pela decoração, e essa linha que foi desenvolvia por profissionais negros. Aqui é um espaço voltado para a exaltação da beleza negra”, diz Léo Santos.

Acolhimento, afirmação e ousadia

Segundo Adriele Regine, mestra em Estudos Étnicos e Africanos pela Universidade Federal da Bahia (Ufba), estes também são espaços de acolhimento. A busca mais intensa por esses espaços vem de uma postura ousada e afirmativa.

“São pessoas que não possuem questões quanto ao uso do seu corpo. Independente do que eu faça, isso não deve causar estranhamento. É também o tipo de espaço que acolhe, usa produtos que lembram os usados pela sabedoria ancestral dos nossos mais velhos, pois sabe cuidar do tipo de cabelo que boa parte dos salões não sabe lidar”, conta Adriele Regine

Adriele Regine é autora da dissertação “Não toleramos mais o seu xiu…: Geração Tombamento, Moda e Política Identitária”. Ela explica que essa mobilização acaba produzindo um efeito cascata.

“Quando uma pessoa que ainda não tomou a iniciativa de mudar seu visual encontra outra que alterou a cor do cabelo ou o corte andando nos mesmos locais que ela frequenta, é comum que cada vez mais apareçam indivíduos com essas alterações nos mais diversos espaços e ambientes, seguindo o caminho da naturalização”.

Resgate estético

Barbearias. SCA. Yudi Barber. Salvador Bahia. Foto divulgação.

Dessa forma, quem senta na cadeira do barbeiro Yudi Fri (@yudiibarber) ganha mais que um serviço que irá impactar em sua autoestima. “Qualquer design tem raiz única, uma linguagem. Os desenhos fazem parte da nossa história, de quem somos. O que hoje pode ser lido como uma identidade da periferia é uma ressignificação do que trazemos como legado do continente africano, onde esses desenhos no cabelo identificavam a origem familiar do indivíduo, um rito religioso, a posição social, entre outros significados”.

Ele, que fez seu primeiro trabalho aos 14 anos, após alguns anos de observação e monitoramento do seu pai, que tem um salão, destaca ainda a importância da atuação dos clientes e dos profissionais no processo de estruturação e crescimento desses estabelecimentos.

“As pessoas pretas passaram a entender como crucial esse resgate da nossa estética, e os empresários perceberam que era preciso buscar os serviços que os clientes de um mundo globalizado estavam em busca”, conta.

Serviço:

Local: Dom Renato
Endereço: Cajazeiras IV, Rua Virgílio Mota leal, 15
Instagram: @renatodombarbearia

Local: Leo Santos Cabeleireiro
Endereço: R. Alto do Saldanha, 17 – Parque Bela Vista
Instagram: @leo_santos_cabeleireiro

Local: Yudi Barber
Endereço: atendimento em domicílio. Agendamento neste link.
Instagram: @yudiibarber