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Soteropolitano tem jeito próprio de garantir um novo ano próspero

Relação com religiões de matrizes africanas influenciam práticas exclusivas

Além das práticas e processos comuns no final do ano, que visam atrair prosperidade e saúde para o novo ciclo que se inicia, o soteropolitano tem ritos próprios para encerrar o período agradecendo conquistas, se afastar do que não foi bom e garantir mais 365 dias com boas energias.

Vestir branco na última e na primeira sexta-feira do ano e visitar a Colina Sagrada na Basílica Santuário Senhor do Bonfim, no bairro do Bonfim, é o primeiro compromisso do dia de uma multidão, independentemente da religião seguida. O dia está associado a religiões de matriz africana. Sexta-feira é o dia dedicado ao orixá Oxalá. Os dias foram denominados ‘Sexta-feira da Gratidão’ (última do ano) e na ‘Sexta-feira da Proteção’ (primeira do ano).

O mesmo costume acontece na Igreja São Lázaro e São Roque, no bairro da Federação. A diferença está no dia da semana em que a quantidade de visitantes aumenta. No caso específico, o dia é a segunda-feira, também por conta da associação dos santos católicos com as divindades do panteão africano. Dessa vez, são as ligadas ao controle dos mistérios sobre a saúde, como Azoany, Kavungo, Omolu, Obaluaê, Sakpata, que têm a segunda-feira como dia de devoção. Faz parte do ritual o banho de pipoca, chamada de “flor do velho”, que é uma forma de purificação e proteção contra doenças.

A prática acontece na área externa da igreja por religiosos do candomblé. As mãos com pipoca são passadas pelo corpo, retirando a carga de energia negativa que esteja causando problemas não apenas na estrutura física de quem está recebendo o banho como também os transtornos que afligem a alma do indivíduo.

Nos dois casos, a orientação é chegar com antecedência para garantir lugar no interior das igrejas, que ficam lotadas ao longo de todo o dia. Os horários de missas são ampliados para dar conta da demanda de devotos nos dois templos.

O costume de colocar oferenda no mar para a Rainha das Águas, como acontece no dia 2 de Fevereiro, no bairro do Rio Vermelho, se repete pela orla da capital baiana na última semana de cada ano, com fluxo mais intenso no dia 31 de dezembro. Os presentes mais comuns são alfazema, flores, sabonetes, entre outros itens, colocados diretamente na água ou dentro de barquinhos de madeira ou pequenos cestos de palha.

Há também quem recorra ao banho de folhas, e é nas barracas nas feiras livres em funcionamento na cidade (Sete Portas, São Joaquim) onde deve haver a maior adesão. Além das folhas, os espaços comercializam os banhos prontos, incensos, patuás (amuletos feitos de tecido na cor do orixá, com o nome bordado e em que é colocado um preparo de ervas e outros elementos relacionados a uma divindade, que podem ser guardados em carteiras ou dentro das bolsas). Prática comum entre os adeptos de religiões de matrizes africanas, a energia das folhas também é utilizada sem relação com a religiosidade. Saiba mais neste link.

Especialista em cosméticos e plantas, a farmacêutica Mona Soares (@ewealquimias/ www.ewealquimias.com.br) ministra cursos para quem quer aprender a manipular plantas e oferece produtos, como o mais recente Banho da Virada, que consiste em um kit com dois preparos: um para se despedir do ano que está acabando e outro para preparar o corpo e a alma para o novo ciclo que está chegando. Na descrição dos ingredientes, o primeiro tem dandá, vence-tudo, quebra-feitiço, cipreste, álcool vegetal, glicerina vegetal, amor e axé. Já o segundo é feito com patchouli, pitanga, menta, abre-caminho, botão-de-ouro, álcool vegetal, glicerina vegetal, amor e axé.

“São práticas de uma medicina ancestral com que temos relação por conta da nossa origem, mas pode ser utilizada por qualquer pessoa como uma forma de cuidado, além do corpo, das emoções. É preciso reservar um tempo para parar e fazer essa conexão com o seu corpo e sua energia. São práticas de uma medicina ancestral. O primeiro de descarrego deve ser usado antes de dormir e a partir do pescoço. O segundo, que é feito com ervas cheirosas, atrai bons fluidos e pode ser usado ao longo do dia”, detalhou Mona.

No caso dos adeptos do candomblé, há a exigência do cumprimento de especificidades que levam em consideração uma série de critérios no uso das plantas, que vão desde a forma de retirada da natureza, passando pela preparação do banho e uso.

“O propósito do banho, o orixá ao qual a pessoa foi consagrada, além de outros elementos, integram o contexto que vai determinar o que pode”, explica a ialorixá do Ile Asé Kalè Bokùn (@ileasekalebokun), no bairro de Plataforma, Vânia Amaral.

Sobre as práticas no encerramento do ano, a sacerdotisa conta que realiza uma oferenda para a comunidade do templo onde é líder espiritual. “É uma espécie de limpeza, renovação de energia e esperança por um mundo melhor. Vou para o oráculo para saber como deve ser o procedimento do ano. Mas cada terreiro tem o seu costume. O mesmo acontece quando fazemos uma consulta sobre a divindade que vai reger o ano. Quando faço isso, obtenho respostas sobre as energias que vão impactar a comunidade religiosa que eu lidero”, explica a ialorixá do terreiro, que é tombado como patrimônio cultural do município pela Fundação Gregório de Mattos (FGM) desde 2018.