O sagrado e o profano, sincretismo religioso, corrida sagrada, festas e passeio de barco
Comemorado na segunda quinta-feira do ano, a tradicional lavagem das escadarias do Bonfim é considerada a segunda maior manifestação popular da Bahia, perdendo apenas para o Carnaval. Nesse dia, que em 2020 cai em 16 de janeiro, milhares de fiéis se reúnem na Cidade Baixa, em Salvador, para participar de missas e de uma das maiores caminhadas religiosas do estado, que ocorre entre a Igreja de Nossa Senhora da Conceição da Praia, no Comércio, e a Colina Sagrada, no Bonfim.
Para você que nunca foi, este é um “roteiro convite”, onde juntamos várias dicas para sua Lavagem do Bonfim ser uma das experiências inesquecíveis da sua vida. As festas populares são parte da essência da Bahia, representam a entrega e a dedicação a um bem maior, uma união de sagrado e profano que só se vê por aqui. Sincretismo religioso, corrida sagrada e passeio de barco, tudo em uma só celebração.
Este ano, moradores e turistas vão ter belas surpresas ao chegarem na Igreja do Nosso Senhor do Bonfim. Houve uma grande restauração em toda a área da Colina Sagrada, o interior da igreja está sendo completamente restaurado, além da fachada, do gradil e da escadaria. O pátio da Colina também foi todo requalificado, garantindo uma festa ainda mais bonita.
Fé e sincretismo
O festejo começa em frente à Igreja da Conceição da Praia, onde acontece um Culto Ecumênico. É bom chegar cedo, a missa começa por voltas das 8h. Os cortejos vão saindo um a um em direção à Igreja do Bonfim. Nosso Senhor do Bonfim é sincretizado com Oxalá. É bem bonito ver todos os tipos de devotos caminhando juntos.
Depois, dá-se início a uma caminhada de aproximadamente 8km até a Igreja de Nosso Senhor do Bonfim. Vários cortejos fazem o trajeto, inclusive o Afoxé Filhos de Gandhy. Eles não têm um horário certo (nem é divulgado) para sair, então você tem duas opções: uma, é ficar ligado e ir andando com eles desde a Conceição da Praia, a outra, é encontrá-los pelo caminho.
O cortejo das baianas sai por volta das 9h30, logo depois da missa ecumênica, muitas vão antes. Ao chegarem na Colina Sagrada, elas lavam a escadaria. E lá outra missa é celebrada no final da manhã. A festa, que tem mais de dois séculos, mobiliza milhares de fiéis, simpatizantes e turistas.
Corrida Sagrada
A Corrida Sagrada é realizada há mais de 30 anos, organizada pela Federação Baiana de Atletismo (FBA) e abre o calendário de corridas de rua da cidade de Salvador. Participantes invadem as ruas da Cidade Baixa em velocidade. A Largada é em Frente à Igreja de Nossa Senhora Conceição da Praia, às 7h, antes de o cortejo das baianas sair em procissão. Tem que se inscrever antes, mas muitos corredores vão na “pipoca” mesmo, correndo por conta própria. Academias de ginástica de toda a cidade também formam seus grupos particulares. A Corrida Sagrada, ou Corrida do Bonfim, como é comumente chamada, é uma das corridas de rua mais famosas, animadas e tradicionais de Salvador. A corrida marca o início dos festejos, pois também já virou tradição soteropolitana.
O Trajeto – Quem tem fé, vai a pé.
O caminho é um verdadeiro passeio turístico, começando pela própria Igreja da Conceição da Praia, construída no século XVII, em estilo gótico, por determinação de Tomé de Souza. Logo passam por dois cartões postais, à direita o Elevador Lacerda (o elevador liga a Cidade Baixa à Cidade Alta) que carrega este nome em homenagem ao engenheiro que o construiu: Augusto Frederico de Lacerda, no século XIX. Do lado esquerdo está o famoso Mercado Modelo com suas quase 300 lojas que vendem artesanato e lembranças locais. Então a caminhada segue por toda a Av. Miguel Calmon.
Logo depois, na Av. Jequitaia, tem o Mercado do Ouro, construído no fim do século XIX, onde fica um dos melhores restaurantes para comer filés em Salvador: o Filé do Juarez. Ainda nesta avenida, tem o Museu du Ritmo, o Trapiche Barnabé, além do plano inclinado que liga a Cidade Baixa ao Santo Antônio Além do Carmo. Já no bairro da Calçada, a Feira de São Joaquim (uma das feiras populares mais icônicas da cidade) está à esquerda e à direita está a Igreja dos Órfãos de São Joaquim.
Mais à frente, no Largo da Calçada, está a estação de trem que liga a Cidade Baixa ao Subúrbio Ferroviário de Salvador e, alguns metros depois, no Largo de Roma, estão as Obras Sociais de Irmã Dulce. Agora você já está perto, falta apenas uma reta para a Colina Sagrada.
Sagrado e Profano
Durante todo o percurso você passa por barraquinhas de bebida e comida, feijoada nas casas das pessoas e no comércio, música para todo gosto, um vai e vem de gente. Vários grupos folclóricos fazem a caminhada, além dos tradicionais carrinhos de café que colocam caixas de som, disputando para ver quem está mais criativo e paramentado.
É bem comum haver festas fechadas como é o caso da Lavagem promovida por Carlinhos Brown, “Enxaguada do Bonfim”, que recebe artistas no Museu do Ritmo para boas apresentações. A música na verdade está em todo o canto, já que muitos cortejos saem com seus próprios micro trios, além de grupos de samba que saem tocando no chão. Muitas dessas pessoas vão para pagar promessas mas, para deixar tudo mais leve e descontraído, fazem festa em agradecimento.
Não pode faltar
Chegar aos pés da Colina Sagrada é uma emoção que não se descreve, só se sente! Já na subida, pessoas de Santo dão banho de ervas e tudo fica com cheiro de arruda e alfazema. Ver tantas pessoas em um mesmo propósito mexe com a alma, te deixando com uma alegria e uma esperança de encher os olhos de lágrimas. Também é comum ver pessoas de joelhos, pagando suas penitências em agradecimento. É uma energia diferente, forte e intensa.
É nesta festa que se explica o gradil ser tão cheio de fitas coloridas amarradas. Uma grande quantidade de pessoas se revezam para amarrarem suas fitinhas do Bonfim e fazerem seus pedidos. Não pode faltar a sua. Vá se colocando devagar bem próximo à grade, tente se ajoelhar lado a lado de tantos fieis. Enquanto você amarra sua fita, olhe por entre a grade e verá que lá dentro muitas baianas já começam a lavar a parte da frente da Igreja. Mais tarde, depois da missa de frente para o pátio lotado, as baianas começam a Lavagem com suas vassouras, flores e potes de água na cabeça.
A praça em frente ao Bonfim fica tomada de gente, barraquinhas de bebidas e comida boa. No final do dia, é comum grupos de amigos voltarem em festas dentro de barcos, escunas e lanchas pela Baía de todos os Santos da Cidade Baixa sentido Comércio. Mas tem que organizar antes, por isso junte os amigos e agende sua volta antes mesmo de ir. Se esse não for o seu caso, a dica é voltar andando até o Largo da Calçada e de lá pegar um moto táxi autorizado para te levar pelo menos até o Elevador Lacerda, do contrário você vai voltar a pé todo o caminho.
Preparamos uma lista com músicas perfeitas para esta experiência. Ouça agora!